segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Qual é a regra?

Por Lilian Cláudia Nacimento
Quem está fora da normalidade é anormal? Mas qual é a regra? Se nascer macho é homem; se fêmea, é mulher. Se for mulher tem instinto materno; se homem, não pode chorar. Política é coisa pra homem; se não, é mulher macho!
A naturalização de fenômenos sociais, como a sexualidade, a cada período histórico provoca tendências e cria verdades. O fato de ter nascido macho ou fêmea não condiciona viver a sexualidade por um instinto fixo a ser satisfeito. Isto equivaleria dizer que prevaleceria o sexo biológico conduzindo uma suposta natureza masculina ou feminina atrelando uma representação de homem e de mulher.
A construção de identidade de gênero e sexual embasa-se no tripé indivíduo-sociedade-política. É preciso entender o contexto, o momento em que se vive sem deixar-se alienar ou entorpecer por cristalizações.
Segundo o DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), 458 mulheres (da região sudeste do país) concorreram ao cargo de Deputado (a) Federal nas últimas eleições. E o cargo de Presidente da República, Chefe do Poder Executivo, está ocupado, e atuante, por uma mulher.
Paradoxos de uma sociedade que vive profundas e rápidas transformações sociais provocando a mobilização dos corpos em torno do desenvolvimento sócio econômico. Então, a maneira de ser homem ou mulher em determinada sociedade vem ao encontro de expectativas socialmente construídas e projetadas sobre os corpos?
Desde seu nascimento, o ser humano assimila códigos, símbolos, modelos de comportamento social a partir da inserção num grupo social. O corpo vivo é constantemente estimulado a viver sua sexualidade, e a partir da educação é tentado dar-lhe significado ao que sente e vive.
A trajetória do ser humano é subjetiva, simbólica e social. Constitui-se de múltiplas possibilidades de satisfação dos desejos que, em meio aos signos produzem o significado do afeto para cada pessoa. E esta pessoa, por sua vez, irá investir este afeto de acordo com o resultado da interiorização desta socialização.
Havendo a construção histórica e social de categorias de gênero, criando diferença entre os papeis sociais de gênero masculino e feminino, compreende-se também relações de poder entre gêneros e o esquadriar de espaços para sua atuação.
A orientação sexual proveniente da construção de uma identidade de gênero vem forçosamente comungando com características sexuais. Dando a falsa sensação de que há uma essência; e, diante da qual não se poderia camuflar, esquecer, esconder, converter, enganar, enganar a si mesmo, frente ao seu papel social já internalizado. 
Compreende-se que o sexo biológico não determina o gênero, mas este é internalizado pelas regras de conduta e pela expectativa social, modelando condutas distintas para os sexos opostos na dinâmica social. O que faz perceber a construção de um elo que atrela categoria de gênero e a vivencia sexual. Como consequência o uso do próprio corpo precisa ser normatizado, recebendo doutrina para o convívio em sociedade.
A autonomia é necessária à organização social. A autonomia sobre o próprio reflete nas formas de relações sociais.

Mais de 108 mil crimes por violência contra a mulher foram relatados através do disque denúncia no ano de 2010, segundo Anuário de Mulheres 2011 (p.281). Dentre os tipos de violência destaca-se a violência sexual, moral, psicológica e cárcere privado.

Um milhão de abortos a cada ano, está é a estimativa na atualidade. O corpo vivo recebe as marcas da passagem do tempo e das mazelas sociais. Aquilo que parecia ser essência configura-se em sofrimento e fatalidade.

A formulação de leis é produto da vontade de grupos de interesses que alcançam certo destaque social, afirmando e fortalecendo modos de vida.

A reafirmação de identidades sociais através da visibilidade de ações realizadas através de grupos sociais organizados poderá provocar transformações sociais que, paulatinamente ganham expressão e poderão subverter a ordem vigente. Então, os movimentos sociais são potencialmente dispositivos de mudança social.

É preciso compreender a trajetória de vidas entrelaçadas por múltiplos compromissos e expectativas sociais que forjam a autoestima daquele que, na maioria das vezes, não tem uma percepção crítica das relações de poder engendradas no cotidiano. E, assim, saem multiplicando comportamentos de subserviência, de inferioridade e culpa de fatos que estão longe de serem desvios.
DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS. Anuário das mulheres brasileiras. SÃO PAULO: DIEESE, 2011.

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